domingo, 30 de março de 2014

Bodas de chumbo

   Ainda que a sutileza e o cuidado com que a imprensa trata os 50 anos da ditadura militar não pareça um mea-culpa pela contribuição aos Anos de Chumbo, todos os sobreviventes tirânicos daquele tempo não poderão comemorar aquela passagem sinistra, assim como os remanescentes da luta armada que ascenderam ao poder não terão a glória de ter conseguido trocar de lado e virado vidraça.
   No Brasil, o poder nunca mudou de face, apenas trocou de mão. A alternância de poder que remonta da velha república, colocando em ebulição os bastidores do cenário político e alimentando a expectativa da sociedade brasileira, apenas elevou o Brasil ao nível de uma grande nação, pelas potencialidades que o país ostenta aos olhos do mundo, o que de uma certa maneira, desperta a cobiça de eventuais parceiros.
   Os arautos da opressão ainda se vangloriam de ter livrado o país das mãos de outros reformistas, mas também não trouxeram as mudanças que permitiriam elevar substancialmente o índice de desenvolvimento do Brasil.
   Com a criação de grandes empresas públicas e a consolidação de importantes mecanismos jurídicos, esperava-se que a administração pública engendrada na caserna trouxessem os benefícios que a riqueza do Brasil pode perfeitamente proporcionar aos cidadãos brasileiros, sejam eles do campo ou da cidade.
   Se o coronelismo freava com rédea curta o desenvolvimento do país, os militares não fizeram diferente ao interromperem importantes projetos de nível nacional à custa do cerceamento das liberdades individuais e coletivas, com ênfase, principalmente, na interdição de educadores e cientistas, vigiados constantemente em suas áreas de atuação.
   Hoje, a dívida social que o poder público tem com a sociedade é tão grande que nem o processo de redemocratização conseguiu resgatar parte considerável desse montante. Com a multiplicação de partidos políticos, várias figuras proeminentes daquele período nebuloso se refugiaram em legendas atualmente conceituadas no cenário político, fazendo valer, até hoje, velhas práticas de grupos políticos que se alinhavam à linha-dura, por força de interesses que ainda prevalecem em vários rincões do Brasil, no mesmo nível de tudo que o poder central e tirânico procurava preservar.
   Um exemplo que ilustra bem esse estado de coisa é a timidez com que estão sendo executadas as obras de transposição das águas do Rio São Francisco, assim como o Pró-Álcool, que no final dos anos 70 definhou pelo mesmo propósito. São projetos que dariam um salto de qualidade para o Brasil na questão energética, além da autossustentabilidade numa época de crise mundial do petróleo.
   A Petrobras só é a menina dos olhos do governo federal porque sempre serviu de balcão de negócio em todas as gestões, inclusive na etapa dos generais, que também discursavam em favor de um estado forte e atuante em área estratégica, sem que isso resultasse em dividendos para a área de saúde e educação, por exemplo.
  As marcas da opressão ainda continuam na forma com que o poder público administra o dinheiro público nas três esferas de governo, o Legislativo como matriz do corporativismo e o Judiciário envolto em letras mornas, que não tem como punir com rigor todos aqueles que surrupiam o patrimônio público.
  Se antigamente a liberdade era cerceada, hoje, os sonhos são interrompidos. 

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