sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

2017 não vai acabar

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 Em todo final de ano são feitos balanços, retrospectiva, cálculos e relembranças de mais um período que se finda. Não seria diferente que em 2017 tivéssemos mais prejuízos a contabilizar do que alguma coisa que possa ter nos feito sorrir de forma solene.
    Não sejamos pessimistas quanto ao ano que vem, mas realistas quando lembrarmos que 2018 terá a mesma face de 2017, considerando que o processo de recuperação ocorrerá no ano seguinte, dando a este período o peso de muito que sofremos até agora.
   É claro que são análises do plano coletivo, porque foi do cenário político que vieram os maiores momentos de angústia para a população como um todo, e a corrupção como a questão mais falada e discutida em todas as esferas de governo.
    Se em outras ocasiões o ano que se iniciava inaugurava novos tempos, certamente 2018 não terá esse estigma de novo horizonte, pois, ainda viveremos os efeitos de todos os contratempos e atropelos desse ano caótico que se finda.
    Como manda a tradição, encerramos esse calendário retirando a última folhinha como viramos as páginas de nossas vidas. Mas por tudo que ficou para trás, mal resolvido, sem uma definição sobre novos tempos e tal, 2018 já surge como uma extensão do ano anterior, como continuação desse período turbulento.
   Não houve elementos e soluções que sinalizassem esse próximo ano como tempos de glória, de conquistas, o que demonstra que vamos penar com a praga da corrupção e seus desdobramentos na gestão da coisa pública.
    Nem as eleições que ocorrerão em 2018 serão uma garantia de outros ventos a soprar em nosso favor, pois, as mesma figuras de sempre surgirão com as mesmas promessas e discursos, sem, contudo, apresentar soluções que impliquem verdadeiras mudanças na realidade das pessoas, dos cidadãos, da sociedade.
    Portanto, o ineditismo do ano que se aproxima se restringe apenas ao novo numeral, sem que isso represente de fato um novo ciclo no atual cenário. Após os fogos, as comemorações, apenas a sensação de bateria recarregada para retomar o rumo que pretendemos, o objetivo que almejamos alcançar, as metas que desejamos cumprir.
    Ao primeiro amanhecer de 2018, as mesmas incertezas da noite anterior, apenas uma pausa para respirar e começar de novo. É como se 2017 não tivesse terminado, apenas se prolongou, tomou uma dimensão maior para que se criasse uma nova perspectiva.
   Então, esse réveillon não celebra uma mudança de fase, de ciclo ou de uma nova era, já que não viraremos o calendário com saldo positivo. As trombetas, os rojões e o tilintar das taças em nenhum momento anunciam novos tempos para a agenda brasileira.
    Que em 2018 haja mais e outros barulhos para reverter esse quadro. 

domingo, 14 de maio de 2017

Lembranças de mamãe

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  Se tinha uma coisa que marcava a personalidade de minha mãe era o seu poder de observação, pelo menos para mim que ficava atento àqueles instantes em que ela observava muito mais além do que seus olhos permitiam enxergar.
   Não que as coisas ao seu redor não tivessem importância, mas dada as circunstâncias e necessidades da época, era comum vê-la pensativa e compenetrada em seu mundo particular, como que a buscar algo, que, pelo menos ali, naquele momento, não estava ao seu alcance.
    Talvez fosse uma reza, uma clemência ou um outro chamamento qualquer que trouxesse soluções para um vazio que parecia existir, uma lacuna a ser preenchida, uma urgência com soluções imediatas.
    Depois que minha mãe se foi demorou um enorme tempo para eu traduzir aquelas leituras que ela fazia com o olhar voltado para o nada e a cabeça fervilhando a todo instante. Foi quando eu percebi que naqueles rompantes de isolamento e concentração absoluta ela buscava providências para a escassez das coisas materiais, porque naquele tempo a única coisa abundante era a infância feliz do contato com o chão cru e os brinquedos de fabricação própria.
    Certa vez, enquanto brincava no quintal da casa, eu vi a minha mãe parada ali, próxima de mim, mas completamente alheia à minha brincadeira. Não foi difícil perceber o seu olhar fixo no vistoso mamoeiro do vizinho. Se era impossível saber o que se passava naquela cabeça pensante, é bem provável que aquela penca de mamões verdes pendurados no caule ilustrasse sua imaginação.
    Hoje, passados esses tempos em que a maturidade permite a superação das dificuldades e outros revezes da vida, eu conservo na mente a nobreza de minha mãe nessa velha arte de se reinventar a todo instante, criando sempre novas formas de sobrevivência, tudo em prol de sua prole.
   Com tamanha dedicação e a certeza de seu importante papel era impossível que seus rebentos sucumbissem ao frio, à sede e, principalmente, pela fome, porque seus seios eram fartos o suficiente para que eu me fortalecesse.
    A lembrança que ficou marcada foi justamente a capacidade que minha mãe tinha de reverter um quadro de penúria em algo magistral, verdadeiramente sublime. Naquele dia, meu irmão interpelou minha mãe sobre aquela coisa verde ensopada e caprichosamente temperada como complemento do arroz e do feijão. E ela. do alto de sua humilde sabedoria e inteligência, aconselhou:
      - Coma, meu filho...é chuchu!!!!

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Os legados da vida

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   Toda vez que um artista morre eu fico imaginando esse tal mistério que cerca a vida das pessoas, ou mais precisamente, o tempo que cada um dura aqui nesse plano. Eu me refiro aos artistas por estarem mais em evidência, mas claro que outros personagens que estão em constante processo de criação também entram na lista.
    Eu lembrei disso  mais uma vez quando soube da morte de Jerry Adriani esta semana. Um artista que mesmo depois de marcar uma grande época, ainda continuava realizando seu trabalho com novidades em seu repertório.
     Isso vale também para as pessoas comuns que tiveram suas vidas interrompidas pela morte prematura no auge de suas carreiras. Para estes, a expectativa de vida é completamente nula. Se existe um cálculo exato e lógico que determina o fim de um tempo de vida, eles vivem em função da margem de erro, aquele espaço em que tudo é incerto, mas real. É quando há a possibilidade de grandes conquistas, seja no plano profissional ou pessoal.
   Mesmo depois do apogeu, ainda há a necessidade de outros feitos. Sem essa de sensação de dever cumprido! 
    Veja quantas pessoas perdem a oportunidade de realizar uma grande obra enquanto respiram. Há um imenso universo de gente que desperdiça a chance de entrar para a galeria dos grandes realizadores. Tomamos como exemplo os políticos que legislam em causa própria e saem pela porta dos fundos nesse cenário em que atuam, frustrando seus herdeiros pela má conduta, e o público que lhes confiou a proeza de um importante marca histórica, sem tampouco desfrutar, no futuro, do prazer de ter realizado algo sublime e grandioso aos olhos de quem os cercam.
    É claro que essas conquistas que fogem de interesse coletivo não contam como júbilo no caso dos agentes públicos envolvidos em malfeitos.
     No plano pessoal só são válidos os sonhos e aspirações de um livro, uma obra de arte, a composição de uma música, a promoção na carreira, a construção de uma família, plantar uma árvore ou praticar o bem, entre outros. São práticas que deixam um legado de fato. É como se escrevêssemos parte de nossa história numa pedra, em vez de na pedra. É isso que basta em nossa vida, seja ela curta ou longa.
    Lamentamos por aqueles que tiveram seus ciclos interrompidos por uma fatalidade qualquer, um tumor maligno, uma bala perdida, uma decepção, um trauma de infância ou falta de coragem para alavancar um projeto.
    Pode ser que os gênios, os nerds, os loucos e outros inteligentes comuns tivessem dado uma nova rotação para o mundo se suas vozes e experiências ecoassem por mais tempo por aqui. De qualquer forma, além dessa incerteza que o mistério da vida vai criando, continuamos aqui convivendo todos juntos e misturado: de um lado, os que correm contra o tempo e se agarram em futilidades; do outro, aqueles que vivem seu próprio tempo e estão sempre deixando um grande legado. 
     
    

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

A inércia e o motim

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  Durante uma semana o que mais se falou foi sobre a rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, onde ocorreu mais uma chacina nas dependências daquela unidade, seguida de outro motim em Boa Vista, onde não é diferente que facções criminosas rivais se digladiam em disputas de poder.
   Como já há registros de que a terceirização do sistema prisional nessas unidades só trouxe lucro aos seus gestores, sem nenhuma contrapartida social, soa como paliativo o encontro do presidente Michel Temer com a presidente do Supremo Tribunal Federal Cármem Lúcia para discutirem alguma medida nessa questão que se arrasta há muito tempo. Mesmo tendo partido da magistrada a iniciativa do encontro, isso não tira do Poder Judiciário a culpa por esse problema que pesa também sobre o Executivo e o Legislativo.
   Na verdade, se houvesse alguma tentativa de conduzir a complexa questão com a seriedade que o tema sugere, os três poderes deveriam estar reunidos numa agenda emergencial junto com os representantes de órgãos governamentais e jurídicos ligados ao assunto.
   Até mesmo a reunião que o ministro da Justiça Alexandre de Moraes convocou com os secretários de Assuntos Penitenciários e de Segurança Pública de todos os estados pode não surtir efeito desejado se não houver de imediato a construção de uma política pública para o setor, dentro de um novo modelo de segurança pública em nível nacional, considerando a iminência de rebeliões em outras unidades prisionais espalhadas pelo Brasil.
   Mas, o que seria dar ares de modernidade aos presídios e penitenciárias brasileiros? Como já ocorreu em outros tempos, por ocasião de registros anteriores de rebeliões, houve tentativas de adequar a rotina do ambiente carcerário à realidade atual, em que detentos mantêm e controlam atividades ilícitas aqui fora, mesmo cumprindo pena.
   Quando se aventou a possibilidade de bloquear sinais de telefonia nas cadeias, havia nesse expediente, finalmente, a solução ou pelo menos, o primeiro passo para isolar os criminosos de alta periculosidade de seus negócios ilícitos, razão pela qual, hoje, facções rivais trancafiadas disputam o poder nos mesmos moldes em que ocorrem nas comunidades de vários centros urbanos do país. Mas, curiosamente, essa comunicação ainda não foi interrompida.
   No caso específico das unidades prisionais terceirizadas, é questionável esse modelo de concessão em que o poder público, ainda continua incumbido de investir no setor cedido à iniciativa privada.
   Como bem mostrou uma reportagem de O Globo, domingo(08/01/2017), um grupo gestor das unidades de Manaus, onde ocorreram os motins opera com suspeitas de superfaturamento, mau uso do dinheiro público, conflito de interesses empresariais e ineficácia de gestão, de acordo com a matéria do jornal.
   Terceirizados ou sob a esfera do governo, o sistema prisional brasileiro necessita de uma ampla reformulação no plano administrativo, institucional e jurídico, sob pena de rebeliões se tornarem rotina e afligirem ainda mais a sociedade brasileira.