sexta-feira, 27 de maio de 2022

VIAGEM INSÓLITA

  

   Tem vez que a gente fica sem vontade ou estímulo para escrever por aqui. Pois é, eu fico assim às vezes, quem nunca? Mas nada que pareça algum desprezo com quem está sempre disposto a ler o que eu reproduzo nesse espaço.
    É claro que o tempo e as circunstâncias hoje em dia nos obrigam a ser bem dinâmicos, aquela capacidade de conciliar várias atividades, em vez de fazer aquela velha lista de prioridades pra tocar o barco sem maiores problemas.
   Mas aí tem o lado mais frágil de toda essa dimensão que é o interior das pessoas que fica por vezes relegado ao ostracismo, talvez por tanta preocupação com o mundo exterior, essa efervescência que a gente vislumbra e respira, enfim, o mundo dos outros que a gente ocupa e sobre o qual dispensa mais atenção automaticamente.
    A situação do país, a guerra comendo solto, a vida das pessoas, as tragédias e as consequências de tudo isso na realidade do mundo, e eu, você e mais outra cabeçada tem de se ligar na rotação da Terra, saber de tudo que está rolando, senão fica desinformado aos olhos de... ninguém.
    Pois é, ninguém se dá conta de toda essa correria frenética, nem se preocupa com isso quando nota seu esforço. Eu, você e uma meia dúzia de neuróticos é que ficam com essa meta pra alcançar, esse desejo incessante de tomar partido das coisas ao nosso redor. Uma paranoia que não rende dividendo algum para você que mais precisa.
    Curiosamente, é o cansaço que nos acorda pra vida, a nossa vida, evidentemente. Agora que foi preciso parar para recarregar as energias, sobrou também tempo para fazer aquela viagem insólita, tipo aquele filme, mas não por acidente, mas de forma compulsória mesmo.
    Veio mesmo a calhar essa mudança de rumo. Que maravilhoso esse reencontro com meus neurônios. Muito gratificante rever a adrenalina que eu usava para os outros. Só eu sei o quanto foi prazeroso sentir novamente a minha própria alegria, rir de mim, não de alguém. Como eu passei esse tempo todo usando minha coragem só para cumprir as tarefas alheias? Eu nem sei o que seria de mim se eu prosseguisse só sentindo as dores dos outros sem intervalo.
     Não é que a gente tenha de fraquejar sobre os destinos do mundo, das pessoas, dos povos, das nações. É preciso mais do que nunca pensar positivo pra afastar a energia ruim que flui à nossa volta. Mas se o mundo ainda ficar por muito tempo todo desordenado, desumano, sanguinário e desequilibrado, é bem capaz de ficarmos pelo caminho, porque nosso prazo de validade por aqui é bem menor que a resistência do planeta às ações do homem.
    Então, é melhor que saibamos dividir nossas atenções igualmente entre esse mundo-cão e o interior de cada um de nós. Eu garanto que quando a gente não era tão conectado como hoje havia mais tempo para um sonho qualquer, para o melhor de nossos projetos. Parece que atualmente já tem cabimento perder tempo com futilidades do que com os anseios que vêm de berço.
    Pois bem, esses recessos que a gente dispõe para nossa agenda pessoal devem ser tão ou mais importantes que as contribuições que damos ao mundo, só acho.