sábado, 26 de fevereiro de 2022

QUAL O LADO DA PAZ?



   Quando a gente fala de paz como uma disposição voluntária que habita dentro de cada ser nesse mundo velho sem fronteira é uma manifestação para que tudo e todos fluam com o espírito e alma sem conflito algum.
     Mas isso não impede uma posição sobre tudo que está acontecendo ao nosso redor, porque o mundo todo é um grande quintal onde todos transitam, e não dá pra fingir que não tá acontecendo nada, só porque a confusão é bem longe de nossas vistas.
    Agora que o bicho tá pegando, a tendência é que a gente fique do lado dos injustiçados, que é o caso dos ucranianos nesse momento. É como se a gente entrasse na guerra também para combater o lado opressor e a determinação de Putin de expandir seus domínios. É evidente a tentativa do líder russo de reproduzir o que era a União Soviética dos tempos de outrora.
     Não é estranho pra ninguém a história de formação de povos e nações à custa de matança e submissão, o que tira de Vladimir Putin o pioneirismo de impor sacrifício às pessoas. Mas vejamos o lado de quem se dispõe a socorrer a pobre Ucrânia agora.
     Os Estados Unidos, que nunca fizeram esforço pra minar a Guerra Fria, tem também um histórico de invasão à nações soberanas por força de interesses e em total desacordo com a Carta da Nações. Além do mais, a Otan desde 1949 só vem aumentando suas fileiras sem sinais de que vá abaixar as armas algum dia.
     Nesse sentido, é natural que Putin se rebele quanto à possibilidade de uma base militar na vizinhança com risco iminente para suas pretensões e se der na telha ele de repente até reedite o equivalente ao Pacto de Varsóvia pra não ficar pra trás nesse globalismo todo.
     Mas fiquemos por aqui, porque Vladimir Putin é sanguinário e mentiu que queria apenas proteger as regiões separatistas, Donetsk e Luhank, e só está mais à vontade em sua empresa na Ucrânia porque tem seguidores por lá em oposição ao presidente local, Volodymyr Zelensky, um judeu vindo da área cultural do país e que certamente incomoda parte da elite política ucraniana, que ainda conserva nas veias a essência do que era a URSS.
      Portanto, a paz é possível, desde que haja consenso e responsabilidade, coisas bem difíceis nesses tempos em que ambos os lados vão se revezando no papel de pedra e vidraça. Até a China, que está chegando agora ao topo do imperialismo já tinha manchas muito mais antigas que a fome atual de engolir Taiwan. De repente, Putin e Xi Jinping até troquem experiências nesse sentido, vai vendo, fechamento total.
      O melhor de reivindicar um pouco de sossego no planeta é não ter de levantar a bandeira de ninguém. Se o próprio conceito de neutralidade implica automaticamente uma certa conivência com o lado tirânico da história no momento, eu fico bem à vontade para esculhambar o Putin, torcendo para que ele também vá para o front, igual ao Zelensky. Vai que de repente a guerra acabe ali.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

BANDEIRA BRANCA, EU QUERO PAZ


 Eu escrevi aqui nesse espaço que não haveria guerra, entendendo o conflito num âmbito global, envolvendo, obviamente, vários países, dividindo o mundo ao meio, sangrando e matando as pessoas de ambos os lados.
     Apesar do envolvimento de alguns países no aspecto político e econômico do conflito com promessas de retaliações e embargos de toda ordem, não há, pelo menos enquanto vou escrevendo por aqui, algum indício de que essa invasão da Rússia à Ucrânia vá tomar contornos mundiais.
    As próprias nações que sinalizam as retaliações afirmam ficar só nisso, ou seja, sem nenhuma intervenção de caráter militar. As experiências anteriores das grandes guerras certamente trazem a ideia das dificuldades de cada um se reconstruir e retomar suas vidas em meio aos escombros, além da quebradeira geral nas finanças de todos os envolvidos, como consta nos livros de História.
    A primeira preocupação diante de uma guerra é a perda de vidas humanas como motivo de angústia e tristeza por parte de qualquer cidadão, independente de sua bandeira, de seu país, de sua origem. É isso que vai fazer a gente torcer para que tudo seja passageiro e tenha o menor efeito na vida das pessoas, como mostram as manifestações pelo fim da guerra.
    Só que há uma realidade em curso que vai ter de ser encarada como tal. Então, a gente volta lá pra trás e vê o quanto velhas questões ficam mal resolvidas no passado e acabam tendo reflexos nas gerações futuras.
    Não é de hoje que há focos de tensão dentro da Ucrânia de grupos que vivem esse tempo todo alimentando projetos de resistência, separatismo e sabotagem do status quo local, sem que o governo, nas administrações anteriores, tenha criado mecanismos que pudessem sufocar e reprimir esses movimentos lá na sua origem. É certo que isso vem dos tempos da fragmentação da União Soviética e foi se fortalecendo cada vez mais até chegar a esse ponto.
     Ninguém vai deixar de lamentar as mortes e a destruição na Ucrânia, mas tudo isso poderia ser evitado em paralelo ao crescimento do país depois de sua independência, mas parece que um contingente considerável plenamente alinhado à Rússia dentro do território da Ucrânia ao longo desses anos com certeza dificultou uma ação nesse sentido.
    A própria anexação da Crimeia, em 2014, pela Rússia, deu uma mostra da fragilidade da Ucrânia frente ao governo de Vladimir Putin. Agora, fica difícil uma situação de perda de mais duas regiões, Donetsk e Luhank, também alinhadas à Rússia, que além de seu poderio militar, ainda se cercou, segundo analistas, de garantias quanto a um provável embargo econômico.
    Mesmo que essas retaliações se confirmem, isso não traz ânimo nem esperança para quem condena o ímpeto de Putin, pois esse processo gera crise de qualquer forma, já que as economias dos países estão interligadas em nível global, incluindo a Rússia, a maior produtora de trigo no mundo, o que permite ver o efeito negativo de limitações ao governo russo.
    Pra quem fica aqui de fora acreditando numa nova mentalidade baseada em experiências do passado, só nos resta esperar o hasteamento da bandeira branca.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

A MÃO QUE AFAGA



     Foi uma semana pra se guardar no lado esquerdo do peito, se a gente desconsiderar o caráter trágico de toda aquela movimentação em Petrópolis para que tudo volte à rotina normal.
     Não tem como não destacar a ação isolada de uma turma extremamente dedicada, concentrada e humanamente envolvida em diminuir os efeitos da tragédia sobre todas as pessoas que só não perderam a vida, mas que precisarão desse suporte, de todo o tipo de ajuda para recomeçar.
     Eu digo isolada porque corre à margem da ação oficial, da agenda governamental, que é aquela que efetivamente deveria se sobressair na agenda de salvamento e rescaldo nas localidades atingidas pelo temporal.
     É gratificante e animador ver aquele exército de gente de todos os lados, as pessoas largando seus afazeres, suas cidades, suas casas, suas famílias e tudo mais para levar algo que possa aliviar o sofrimento de muita gente numa hora dessa.
     No Rio e em outras cidades, postos de recolhimento de alimentos, água, roupas. Várias denominações religiosas convocando seus seguidores. Motoqueiros, voluntários em grupos ou individuais, pessoas munidas de pás e enxadas, ajudando na busca por desaparecidos, enfim, uma cruzada paralela às ações governamentais, que certamente vai contribuir para toda a operação em geral.
    Dá até pra afirmar com muita segurança que a solidariedade nesses casos prevalece sobre os próprios expedientes que as esferas municipal e estadual precisam cumprir, cada um dentro de suas prerrogativas. Basta voltar lá atrás nos mesmos eventos já ocorridos, que agora se repete, justamente porque houve omissão, descaso ou pouco empenho no conjunto de ações que poderia a essa altura ter evitado toda essa tragédia.
     Se por um acaso nada for feito mais uma vez, piorando ainda mais a situação, a única garantia é o olhar humano das pessoas comuns e instituições sempre prontas e preparadas para essas urgências, apesar dos compromissos e obrigações da prefeitura junto com os órgãos sob sua esfera de operar com políticas pertinentes à questão.
     Quando vemos esse monte de gente em seu instinto de caridade em várias frentes, isso dá, não só a dimensão da tragédia, como revela que nessas localidades sempre carentes de serviço público não basta apenas a presença do braço armado do estado.
    As imagens de toda essa ação de busca mostram as vísceras de problemas que vêm de várias gestões, mostra a necessidade de um pacote de medidas, que em todas as comunidades de todas as cidades é sistematicamente ignorada ao longo dos tempos.
      Há um descaso para as necessidades básicas, além da burocracia em busca de soluções, fora a velha conhecida corrupção. Por isso, é preciso sempre pensar a solidariedade como uma ação edificante em todos os aspectos. É a solidariedade que ameniza as dores das mazelas humanas, suaviza a angústia das pessoas e traz conforto para as injustiças em geral.
     Enfim, a solidariedade é uma mão que afaga.


                                                      Foto: ABC do ABC

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

A LAMA SUSTENTÁVEL


   Falar sobre a perda de vidas humanas em tragédias de acidentes naturais tem de ser feito sob um olhar bem diferente do que já foi explanado ao longos desses tempos até agora, porque, não bastasse a imprensa tradicional a espetacularizar as dores, as angústias e a lama escorrendo nas manchetes e sites de notícias, a gente que também se solidariza com tudo isso, se não tiver o mínimo cuidado pode incorrer no mesmo erro de ficar repetindo a ladainha de sempre.
   A partir de agora, mais importante que contabilizar as mortes em cada inserção nas mídias é cobrar o que deve de fato ser feito para interromper esse ciclo de desastres. Se algum membro do poder público em qualquer esfera de governo falar das dificuldades para se implementar os projetos destinados a essa questão, é bom lembrar que há amplos estudos feitos em função de eventos anteriores, que pela mesma natureza pode ser posto em prática agora, já que não foi feito antes.
    Não é de hoje que os principais órgãos de pesquisa ligados as universidades e entidades que discutem a questão vêm apontando soluções e direcionando, principalmente, às prefeituras, que é de onde devem efetivamente brotar as intervenções, dada a particularidade que cada cidade envolvida tem. Veja a diferença da geografia do Rio de Janeiro para a de Petrópolis, por exemplo. Daí a importância desses estudos que a comunidade científica não cansa de destacar.
      Seguramente em todas as cidades onde ocorrem essas tragédias há um projeto enfiado numa gaveta qualquer esperando para se tornar uma grande obra que pode reverter todo esse quadro triste e angustiante. Mas como sempre acontece, esbarra na falta de vontade política, quando vão empurrando, mesmo depois de várias vidas humanas ceifadas. Depois que limpam as ruas, recolhem os lixos e a lama e tudo volta ao normal, nenhum prefeito arregaça as mangas junto com os órgãos competentes para modificar os cenários atingidos e evitar mortes.
     Os governos federal e estadual estão sempre enviando recursos em caráter de emergência, mas ninguém presta conta de nada, fica por isso mesmo. Os Tribunais de Contas e as Câmaras municipais e estadual, que deveriam fiscalizar o descaso com a vida das pessoas e com o dinheiro público também se calam.
  O resultado de tudo isso são cidades completamente inviáveis para os próprios nativos. A população fica desguarnecida porque o poder público não consegue gerir crise, enquanto tragédias como essas acabam interferindo no desenvolvimento das cidades. As principais metrópoles do mundo se modernizando e aqui cidades com capacidade de acompanhar as novas tendências de intervenções urbanas optam por incorporar as tragédias em nosso calendário, tornando a lama cada vez mais sustentável.

NÃO VAI TER GUERRA



  Num momento assim de muito saudosismo em função dos últimos acontecimentos estive pensando nas velhas rusgas da escola, onde tinha mais gente botando pilha do que as duas partes chegarem às vias de fato.
     Quando o tempo esquentava pra valer, é porque umas das partes é que tinha decidido o conflito e decretava logo: “vou te pegar lá fora!”.
     Pois bem, é dentro desse cenário que vivem no momento a Rússia e a Ucrânia, cada um em seu quadrado. Se existe uma mínima possibilidade de agressão mútua é apenas pilha dos Estados Unidos que estão meio que chateados com o fim do seu protagonismo na globalização, incluindo, claro, a sua já manjada política externa completamente ultrapassada, aquele velho expediente de invadir país alheio em caráter militar.
      Mesmo depois que o Putin recue suas tropas da fronteira prosseguirá o racha na Ucrânia, cuja população se divide há muito tempo entre a tradição soviética e o eurocentrismo, e o líder russo apenas faz a publicidade de seu regime autocrático, garantindo a integridade e a passagem de ida sem volta para quem se bandear para os lados do Kremlin.
     Quanto ao Tio Sam, não rola nem cola mais esse disse-me-disse de que o Putin vai partir pra porrada, aí, vai ter de retaliar e criar embargo à Rússia e convencer a comunidade europeia a ficar no escuro, com a lareira desligada e não comprar gás de Moscou, coitado.
     O Vladimir Putin já não valia um rublo quando garantia o PIB nacional apenas exportando armas e vodka, imagine agora com o aval da China para blindá-lo de qualquer retaliação.
    Se analistas já cravavam que a China chegaria ao topo apenas depois que a economia americana se fragmentasse, daqui a cinco anos, sei lá...a verdade é que Xi Jinping já tá com uma mão na taça.
     E tudo isso tudo sem pegar em armas, apenas praticando o dumping, lembra?.. e agora, deixando abertos os vidrinhos do laboratório lá em Wuhan, numa mostra de que os chineses não guardam rancor de ninguém, tanto que Mao Tse Tung fez todo aquele alvoroço com a revolução e em nenhum momento jogou na cara do mundo que eles inventaram o papel e o nanquim e não receberam recompensa alguma por isso. Se fosse assim, alguém teria sofrido as consequências também pelo macarrão que Marco Polo surrupiou e patenteou na Itália, alcançando um status muito maior que aquelas guloseimas que levam lagartixas e escorpiões.
    Portanto, é certo que todo aquele bafafá lá no eixo Moscou-Kiev se esfrie, mesmo que Joe Biden insista em ficar fazendo fuxico e a imprensa internacional parecendo essas revistas de fofocas, enquanto a China vai confirmando seu novo papel de síndico do globalismo, sem fazer barulho, mas mandando nas peças desse tabuleiro todo, como é fácil perceber.
      Embora esses caras ficam investindo dinheiro pra se armarem até os dentes, eles sabem que os custos de uma reconstrução pós-guerra seriam bem maiores, o que nos faz acreditar que Putin tá apenas se exibindo com seu arsenal, pra mostrar para a Otan que não tá de bobeira também não, pura ostentação. Dá pra ver pelo tamanho da mesa que Putin usa pra ficar ali de trololó, vai vendo.
     Na moral, gente...o cara que tem uma mesa daquela não quer guerra com ninguém.

domingo, 13 de fevereiro de 2022

COMO ASSIM, ESSA INFLUÊNCIA?

 

   Já virou rotina o expediente que aquele sujeito faz todos os dias pra se inteirar das notícias dos jornais. Virou um evento assim um tanto quanto religioso parar pra ver o que tá rolando no entorno. 
    Tem dia que é bastante concorrido por causa dos jogos do campeonato, além, é claro, da agenda do cenário político, pra não ficar de fora dos últimos acontecimento, que agora o povo tá mais politizado, quer dizer...bom, é melhor dizer que as pessoas estão agora mais familiarizada com toda essa polarização.
    Já teve dia de o cara chegar e ter de esperar a sua vez pra ler de tanta gente que tinha no pedaço. Muita discussão também. Quando não era por causa de Lula e Bolsonaro, era pelo Big Brother, maior stress ali, já de manhã.
    Só que ultimamente ele vinha estranhando um monte de expressões em inglês nas manchetes ali expostas. Um troço difícil de ler, de entender. Será que o jornal também tem um investidor americano, igual ao Botafogo?
     Fica até difícil soletrar pra saber o que significa de fato aquele negócio escrito ali. Pra ele era mais estranho que prender jornal com pregador, vai vendo.
    Mas nesses tempos em que tudo que vem escrito nos jornais dá briga, o cara fica até bolado de ficar questionando alguma coisa que já mexe com os brios de um monte de gente nas redondezas. O negócio tá num nível que você começa a falar, antes de concluir já ganha grátis um rótulo de fascista ou comunista, de acordo com o critério do interlocutor.
     E parece que esse negócio de grafar algumas situações em inglês, assim na lata, sem nenhum plebiscito pra saber se o povo quer, vai bagunçar um pouco mais o coreto, porque, neguim já pena pra interpretar o texto e ainda vai ter de traduzir a parada? Ah, não...!
     Mas aquele cara, pelo menos ele, não vai ter muita dificuldade, não, porque ele é humilde o suficiente pra se desenrolar, ele puxa assunto com as pessoas. Isso já o deixa num outro patamar de sobrevivência humana. Afinal de contas, ele é do tempo que não tinha Google para procurar as coisas, tinha de perguntar mesmo, se não quisesse ir pesquisar na biblioteca da cidade, é claro.
    Uma bagagem que ele criou que o deixa bem à vontade pra perguntar sem muita cerimônia, apenas com a educação necessária em qualquer situação. E aquela mulher ao seu lado olhando as notícias poderia perfeitamente tirar uma dúvida que lhe tomava o juízo naquele momento. Afinal, o que era aquela expressão Influencer? Era num primeiro olhar uma grafia estranha de algo familiar na língua português.
     “Tá sinistro(sic) essas palavras em inglês, agora, né?”, disparou ele para a mulher, que em nenhum momento considerou assédio aquela letra, tanto que logo respondeu de pronto que estava na moda, era uma tendência de mercado e tal.
      Mas o que é uma pessoa com essa marca, essa etiqueta, quis saber o cara. “São essas pessoas que criam um canal pra mostrar o comportamento dos outros, ditam regras, moda, além de mensagens motivacionais para os seguidores, essas coisas”, esclareceu a moça na hora.
    Pela exposição do termo ele certamente achava que era uma profissão nova e diferenciada, daquelas que exigem um saber específico, ainda mais agora com essa nova era tecnológica. “Ah, é isso?”.
    Retomando seu rumo vai junto a cabeça povoada de realidades distintas, mas conhecidas de todos, apenas uma roupagem diferente nos atores de cada cenário. Que novidade há em alguém que surge do nada para estabelecer padrões para as pessoas, coisas e situações, quando já sofremos influência desde nossa concepção?
     Os influenciadores são longevos demais para acreditarmos que eles sejam emergentes nas práticas humanas. Enfim, já deveriam ter regulamentado há muito tempo essa profissão.

domingo, 6 de fevereiro de 2022

O MACARRÃO

  

  Há também benefícios e vantagens nos exageros que a gente comete em oposição a essa velha falação de que tudo em excesso faz mal. Eu acredito até que muita gente, inclusive eu, deixou de fazer alguma coisa por medo de passar dos limites.
    Se eu fosse listar as coisas que eu deixei de lado nessas circunstâncias muita gente iria achar exagero de minha parte, mas eu também já tive muito cagaço de fazer alguma coisa e contrariar a sociedade, veja só.
    Fiquei pensando nessas coisas enquanto fazia um macarrão que eu prometi pra minha namorada. Ao longo dos tempos eu fui aprimorando fazer essa delícia que chegou a um nível insuportável de gostosura, tá pensando o quê? Tanto que a Margareth quando tem a oportunidade de degustar o macarrão chega até a exagerar.
  E não foi por outra causa que ela ficou empanzinada, me deixando até preocupado, já era tarde, enfim...mas, com um certo orgulho por deixá-la saciada de alguma forma, porque desse jeito o macarrão já se tornou uma alternativa de prazer, vai vendo. Não preciso nem falar quem poderia explicar esse negócio.
    Sem querer fazer confusão com teses e ideias já implantadas, dá até pra assegurar que o prazer também é relativo, ora bolas. Certamente, Einstein e Freud não se importariam com esse meu entusiasmo, muito pelo contrário, iriam usar a pança toda estufada da Margareth como campo de estudo e observação, e eu tendo que explicar pros caras quais critérios eu utilizei com cálculo e tudo.
   Os malucos fariam da minha receita de macarrão uma nova fórmula de matemática, sei lá...eu prefiro de química, que combina mais com essa vibe entre mim e a mina. Até porque misturar molho, tempero e amor em proporções devidamente calculadas é uma disciplina considerável e aconselhável para quem se permite criar novos sabores pras suas vidas. E se esses malucos estudiosos não levam esses ingredientes pro laboratório, só lamento, meu camarada. Eu acho até que isso poderia mudar o destino da humanidade, se se pudesse eliminar a margem de erro de algumas decisões, mas isso é outro assunto.
     De qualquer forma, isso serve pra quem fica com medo de se deliciar com alguma coisa que pode eventualmente mudar no dia seguinte a silhueta e o humor, tudo junto e misturado. E para legitimar a qualidade do macarrão que eu preparo, independente do exagero e da modéstia, eu me sinto aliviado e realizado por ela não carregar alguma culpa pro dia seguinte, quando tudo que geralmente fica em excesso é geralmente eliminado compulsoriamente, naturalmente, sem stress.
  E como a mina não reclamou de nada ao amanhecer, dos efeitos daquele jantar altamente substancioso, eu logo atestei e conclui que o macarrão lá de casa não é de se jogar fora, beleza.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

O AÇOITE CONTINUA




   Não dá pra passar em branco um assunto dos mais cruéis na realidade humana: a barbárie, que ao longo dos tempos, ao longo até da existência do homem prevalece sobre qualquer natureza em que os indivíduos se confrontam. 
    O espancamento do jovem congolês Moïse Kabamgabe até a morte em seu próprio local de trabalho revela, além do extremismo que aos poucos vai se banalizando, ilustra o descaso com a vida alheia e a velha impunidade de sempre, porque não é de hoje que esse tipo de coisa acontece ao nosso redor, sem que haja uma reparação qualquer, uma resposta à sociedade.  
    Toda e qualquer manifestação de repúdio ao ódio, ao racismo, à xenofobia é pouco nesse momento, porque não adianta apenas se escandalizar toda vez que as pessoas chegam ao extremo. Não pode o sentimento de tristeza que abala as pessoas virar apenas um espetáculo midiático no momento de dor para a família do rapaz, e para nós brasileiros que também vivenciamos a violência em nossa agenda.
    É preciso uma resposta imediata dos órgãos de segurança e do Judiciário para identificar e punir com rigor os autores de tamanha crueldade. Seria o primeiro esforço para ir eliminando aos poucos a cultura da intolerância, do ódio que ainda impera na maioria das vezes em que há um distúrbio, uma rusga qualquer nas relações humanas.
     O rapaz não morreu no conflito que marca o seu país. Ele veio morrer onde esperava preservar sua vida. Ele foi surrado até a morte aqui no Brasil ao reivindicar um direito legítimo de quem trabalha, porque, infelizmente, ainda há uma parcela que não se desgarrou do açoite como forma de eliminar as pessoas. Uma das faces mais cruéis da história da humanidade vem, sistematicamente, se repetindo, e o que é pior, sem sinal algum de que isso possa ser interrompido algum dia.
    Agora, o mínimo que se espera é o máximo rigor da lei, porque existem elementos suficientes para isso. A própria repetição desses fatos como rotina, tanto aqui no Brasil como em outros quadrantes já implica uma urgência. 
    E o Brasil, por ser uma nação soberana, hospitaleira e, principalmente, por sua miscigenação, pode perfeitamente dar o exemplo de como barrar esse processo de barbárie cotidiana. 

                               Foto: reprodução/facebook