Um dia desses vinha passando pela Avenida Atlântica e vi um monte de quadros expostos à venda, bem em frente a um famoso hotel. Desacelerei um pouco o carro para vislumbrar aquela pequena, mas deslumbrante galeria ao ar livre, como que a confortar a rotina massante que vivemos todos os dias, de trânsito caótico, da efervescência que uma grande metrópole respira.
Por alguns segundos pude perceber o quanto a arte nos conforta das dores do mundo. Eram rostos humanos, paisagens e naturezas mortas na dimensão exata de como a arte deve ser politizadora, socializante ou, pelo menos, romântica. Foi gratificante pensar que um sujeito anônimo representava ali, dentro de pequenas e imensas molduras nossos mais nobres anseios e aspirações, de como a arte nos impulsiona pelos valores que herdamos dos semelhantes de outrora.
Como nem tudo é perfeito, logo percebi que me transportei do céu ao inferno, rapidamente, sem precisar dobrar a esquina. Em meio àquela profusão de óleos, pasteis e crayons surge, de repente, figuras humanas com número abaixo, em cavaletes claudicantes, suporte de mentes vacilantes e obscuras, como uma extensão medonha da vernisssage que eu acabara de vislumbrar. O realismo em nuances diferentes, no mesmo vetor, na mesma calçada. O bem e o mal ocupando o mesmo espaço e tempo.
Fui obrigado a disfarçar meu repentino desencanto para não perder a direção. Por um momento parecia que eu caminhava em linhas tortas, sem destino. A sensação de não saber para onde ir se confundia com a desesperança que toma conta das ruas, do futuro incerto por sermos mal representados em nossos projetos de vida, de sociedade, de humanidade, enfim.
Se algum dia arte e a política andaram de mãos dadas, esse tempo já vai muito longe, porque hoje elas são dissonantes, antagônicas. A arte congrega os homens; a política desagrega. A arte acompanha a evolução dos tempos; a política distorce o tempos dos homens.
Pobre homem moderno, que espera que a arte da política um dia seja a alavanca do progresso e da evolução humana. Infeliz do homem que se esquiva da arte para enaltecer a política dos homens sem arte.
A arte e a política só se equivalem pelo caráter perene de suas ocorrências. Uma pela nobreza, a outra, pela miséria.
A arte e a política só se equivalem pelo caráter perene de suas ocorrências. Uma pela nobreza, a outra, pela miséria.