quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

POLÍTICO BOM É POLÍTICO DURO

  
   Aos poucos a corrupção no Brasil vai ganhando novos contornos, novos elementos, até, se adequando aos novos tempos, melhor dizendo, com o objetivo, claro, de eternizar essa velha prática.
   Se o modus operandis da atividade continua o mesmo, já que com o tempo foi se chegando a um modelo ideal de se usurpar a coisa pública com menos riscos possíveis, a forma como ela é tratada, conservada e protegida é que vem sofrendo alterações ao longo dos tempos. Com o advento de novas ferramentas, por que também não seguir novas tendências?
   Com a prisão do deputado Daniel Silveira acendeu um sinal de alerta entre os pares com a iminência de riscos à carreira dos parlamentares. Não que a decisão do Supremo Tribunal Federal de prender o sujeito tenha sido descabida, que os ministros da corte tenham excedido os limites que a lei estabelece. Muito pelo contrário, foi tudo legal, dentro dos conformes de como reza a própria constituição.
   E é justamente ai que mora o perigo, essa facilidade que a lei oferece de frear o ímpeto dessa gente sem vergonha; de deter a sanha de vossas excelências em suas práticas corriqueiras e isso de repente virar um grande filão, imagina, a mamata com seus dias contados com novos tempos, agora de perseguição aos corruptos de todo o Brasil.
   Pensando nisso, não foi difícil para os nobres deputados quase vararem a noite e articularem uma emenda à constituição para restringir a atuação do Ministério Público e da justiça contra os parlamentares que vierem eventualmente a mijar fora do penico daqui pra frente.
   A ideia é que o malandro preso fique sob a tutela do próprio Congresso, e os membros da Comissão de Constituição e Justiça da casa encarregados de decidir o destino do sujeito, que de repente poderá  ficar numa salinha reservada e confortável pra despachar, tocar os negócios, visita íntima, olha que bacana, bem aos moldes dos outros circuitos carcerários, mas como já foi destacado, gente, tudo dentro da lei, pra não ter reclamações posteriores e ao mesmo tempo sempre passar a ideia para a opinião pública de que a nossa democracia pode até tá bagunçada em algum aspecto, mas sempre prezando pela legalidade e o estado de direito.
   Portanto, se agora vai ser mais difícil ver os caras presos, resta agora à sociedade mudar também a forma de se indignar com os futuros escândalos. Não adianta mais ficar reivindicando prisão nas passeatas, nas redes sociais  que não vai rolar.
    A própria justiça em todas as suas instâncias, juntamente com os órgãos de investigações vai ter de mudar também todo esse entendimento e interpretações e outros procedimentos que antes visavam exclusivamente o velho e agora completamente obsoleto expediente de ver o sol nascer quadrado.
   O grande lance agora é priorizar o desmonte do poder econômico do cara, como já fazem com os outros bandidos, os das comunidades, naqueles derrames de armas, materiais e dinheiro, que deixam os caras totalmente desarticulados, num expediente que se estendido aos gabinetes pode também ter o mesmo efeito, vai vendo.
   Apesar de toda essa movimentação corporativista da Câmara dos Deputados para proteger seus pares, eles ainda vão precisar de seus advogados. Pois é. É justo o cara ainda usar o próprio dinheiro desviado pra pagar os honorários? Às vezes usam o dinheiro até pra comprar voto, olha só. Já não basta comprar carro, apartamento e fazenda no nome de parente?
   Da mesma forma que os parlamentares se anteciparam nessa blindagem explícita e imoral, dentro do que se permite interpretar, o judiciário também pode perfeitamente adotar novos procedimentos, deixar os caras sem grana, simplesmente. Por mim pode ficar por ai, livre, cumprindo expediente, se não quiser ou puder cassar o sujeito, mas sem usufruir do dinheiro da treta. Quero ver tirar essa onda duro, vagabundo, assim é mole, é como vai explanar muita gente nesse novo cenário e expectativa.
   Pode ser até que lá na frente a Câmara reaja a esta  essa nova investida contra a corrupção, ponderando que a classe política precisa ter dinheiro pra gastar e com isso movimentar  a economia do país, ora bolas. É um montante considerável para um país que precisa recuperar suas finanças, enfim...
   Mas não deixa de ser interessante essa prática como regra, cancelar as finanças, interditar o empoderamento dos bandidos, já que prender vai ficando cada vez mais difícil. De repente político bom é político duro.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

NADA DE FANTASIA

 

    Já dá pra fazer um balanço desse Carnaval com ênfase na pandemia que atravessou todas as avenidas da cidade. Tem sempre uma meia dúzia de gatos pingados que não conseguem sossegar o facho e só param quando tomam uma dura do guarda, não tem jeito, em todo canto sempre rola uma concentração aqui e ali.
   É uma massa que ainda não criou aquela noção necessária que lhe permita contribuir para uma grande causa como sugere um cidadão de fato. É triste ainda ver aglomerações nas comunidades, em condomínios, sítios, numa total falta de consciência e respeito com quem sofre ou teve uma perda em família.
   Mas no geral é até de se estranhar essa calmaria na cidade, todo mundo comportado, curtindo o Carnaval do jeito que o próprio calendário recomenda, com aquela moderação que destoa completamente do que foi aquele ano que passou, mas necessário para que possamos retomar a brincadeira depois com tranquilidade.
   Já rodei pela cidade e percebo as pessoas bem cautelosas, principalmente nos ambientes comerciais, supermercados, shoppings, em grupos reduzidos. As famílias, a rapaziada nos bares, tudo numa atmosfera bem calma, uma síntese de todo um processo de conscientização em momento tão delicado para todas as pessoas.
    É bacana, é gratificante ver o folião recolhido em sua sanha festiva, conformado em abrir mão de pular durante quatro dias sem parar, segurando a onda legal em vez de extravasar a alegria no momento em que milhares de brasileiros penam em hospitais ou esperando tratamento.
    É legal saber que aquele folião que passa o ano inteiro se preparando para a festa, hoje, completamente resignado, engrossa o coro de quem vai esperar pra comemorar, sair no bloco, desfilar na Avenida, quando toda a população estiver segura para incorporar novamente seu espírito festivo.
   Não é porque a festa maior do Carnaval foi suspensa que vai perder o seu valor. Tem uma galera bem bacana fazendo live, cada um com sua fantasia, em família, com toda segurança e animação, num espírito que deve prevalecer mesmo com toda a tristeza, mas com a expectativa de a alegria voltar a contagiar todos no próximo Carnaval.
   De qualquer forma, é animador saber que a maioria entendeu perfeitamente a gravidade da pandemia e guardou a fantasia, reservando a festa pra depois, quando haverá de fato algo especial pra comemorar.
    Por enquanto, ainda falta um envolvimento maior de muita gente, sem essas aglomerações, e o governo também acelerando a vacinação, sem deixar faltar, para que a gente tire dez em harmonia.
  

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

ESQUECIMENTO

 
   O Supremo Tribunal Federal deu um desfecho favorável à sociedade brasileira sobre um caso de uma jovem assassinada em 1958, em que a família da vitima vinha ao longo desses anos por meio jurídico tentando fazer com que o caso caísse no esquecimento, ou seja, impedir que os meios de comunicação tornassem público, trazendo à tona, ou melhor, à lembrança, um fato que certamente repercutiu bastante.
   Nunca é demais lembrar que a imprensa é sempre o primeiro alvo quando se aventam a possibilidade de ocultar fatos, situações, realidade. Claro, a imprensa de uma maneira bem ampla mesmo, estendendo a tempos bem distantes, quando antes de Jornal, Rádio e Televisão, as artes e a literatura é que tinham essa função de divulgação universal de tudo que se inventava e jogasse pra rolo para as considerações da opinião pública.
   Aqui a gente fala do esquecimento de uma forma conceitual, à margem de todo o processo natural em que a mente falha de fato, como ação daquele alemãozinho, o Alzheimer, que acelera naturalmente  o enfraquecimento da mente humana, que mesmo em processo de degeneração ainda mantém acesos fatos bem distantes. É um outro mecanismo que reproduz, de repente de uma forma até mais eficaz, o expediente de apagar da memória as coisas, as pessoas, as histórias,  enfim.
   Eu não lembro porque eu ainda não vagava por aqui, mas me contaram que a Inquisição tinha essa agenda de isolar das pessoas trabalhos científicos, teses, tratados, lançando na fogueira criador e criatura, tudo junto e misturado pra que não houvesse chance de ressurgimento daquelas coisas hereges. Eu mesmo ficava chateado quando mamãe escondia ou jogava fora minhas revistinhas. Só sobravam os gibis, sobre os quais  dona Zélia não via perigo algum, menos mal.
   Quantos reis, imperadores, ditadores já apagaram registros importantes que só foram descobertos porque essa gente sempre deixava rastro? O próprio Hitler não tinha paciência pra esperar a fogueira arder até o fim, aí, sempre aparecia um desses garimpeiros de rua, catando latinha, que acabavam montando um sebo também, reforçando a tese de que o senso comum também contribuiu bastante pra que nada caísse no esquecimento.
  Com o tempo foram surgindo novas modalidades de ocultação da realidade ao redor do mundo até o aprimoramento das mentiras disparadas em larga escala, depois que a invenção de Goebel caiu em domínio público.
   Agora, quando a gente ouve a fala da ministra Cármem Lúcia do STF lembrando que há um esforço para que tudo seja lembrado no Brasil, é bem abrangente a explanação da magistrada com pitadas até de mea-culpa, pois, a própria instituição já proferiu sentença cerceando a liberdade da imprensa em prol de gente incomodada com a publicação de tretas de interesse público. Um caso recente são as rachadinhas do filho do homem, ninguém pode tocar no assunto.
   Se duvidar, até a Lava Jato vai cair no ostracismo, quem diria, já até se descentralizou. Agora que o Centrão, na figura do Arthur Lira, cheio de processo nas costas, certamente não vai manifestar interesse algum, ainda mais que o presidente nem pensa nessa possibilidade, sei lá,  com alguma PEC ou um projetozinho de lei sequer, mas, esquece, que essa gente de repente tem outros projetos para o Brasil.
   Tanto no espectro da imprensa, do poder ou da justiça, não há garantia de que o melhor para a sociedade será revelado naturalmente ou oculto de propósito, vai depender do interesse de cada parte envolvida resolver o que você pode saber e o que você deve esquecer, vai vendo.
    
  
 
  
  

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

EXTREMOS

 
      Há quem prefira aquele sol escaldante, como eu, por exemplo, mas há quem se delicie com uma chuvarada também. Pra muita gente, se vier então acompanhada de uma geada, de um vento congelante, melhor ainda. Uma prova de que tudo que cai do céu também divide a humanidade.
    Eu acredito até que num futuro ainda bem distante os climas do planeta serão apenas de extremos, sem essa chatice para alguns de clima tropical, porque aí é como o cara ficar em cima do muro, coisa politicamente incorreta nos dias de hoje. Fresco mesmo só quem ficar lembrando dessas coisas. Saudosista vai até sofrer bullying, tipo, sai pra lá, ô, viadinho...
  Pois bem, será assim, frio pra burro ou calor do caramba em polos equidistantes e de forma alternada, podendo até provocar migrações de quem puder tirar onda, ah, muleque. Por exemplo, o cara que tiver grana vai ter uma casa em cada hemisfério, tudo pra fugir do calor dos infernos ou da era glacial com a família,  de acordo com o gosto de cada um, mas sem polarização, por favor, porque certamente vão lembrar que no passado a chapa costumava esquentar  por causa de algumas diferenças, inclusive climáticas, vai vendo.
   Problema maior vai ter aquele casal dividido pela temperatura, ele friento, escolhendo tudo; ela, calorenta, queimando em brasa. Ele na Europa; ela, na América do Sul, só se encontram no traslado, nas escalas de voo. Os aeroportos já terão até ambiente reservado pra encontros íntimos, olha só.
   E assim a humanidade vai levando a vida, a Terra vai girando. Enquanto a natureza agrada a gregos e troianos, cada um vai formando a capacidade e o privilégio de conviver com as diferenças, e assim, o prazer alheio deixa de ser um infortúnio ou desgraça pra quem quer que seja. Tanto a nesga de sol pela manhã quanto as gotículas de chuva ao entardecer trazem a sensação de um novo olhar sobre o outro, o que alimenta a esperança  de que outras manifestações entre o céu e a terra também nos inspirem enormemente nesse sentido.
   Tanto num dia deslumbrante quanto em outro nebuloso, há um sol que nasceu pra todo mundo nesses extremos da vida.