Já foi o tempo em que os velhos "paus de arara" intensificavam o movimento migratório para os grandes centros urbanos do país. Se hoje o êxodo rural já não tem o mesmo fluxo de outrora, ainda que em outros meios de locomoção mais modernos, os efeitos dessa concentração nas grandes metrópoles são cada vez mais visíveis.
A tragédia que marca a vida das pessoas que vivem de ocupações irregulares vai muito mais além da queda do edifício que desabou em São Paulo. Por entre as cinzas e os destroços revela-se uma mazela que se arrasta faz tempo: o inchaço das grandes cidades.
Por ser o destino final da maioria daqueles que fugiram da seca nas regiões norte e nordeste do Brasil há décadas passadas, São Paulo hoje registra os piores indicativos para o déficit habitacional que acomete outras cidades que também se tornaram o destino dessa massa de retirantes.
Como bem declarou o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, após o incêndio e queda do edifício do Largo do Paissandú, se existem mesmo cerca de 70 prédios públicos invadidos e habitados irregularmente na capital paulista, o desafio para solucionar o problema certamente é maior do que se imagina.
No caso específico do prédio que caiu, muitos moradores daquela unidade já tinham sido deslocados de outra comunidade também destruída por incêndio, o que demonstra a falta de interesse do poder público para solucionar o problema.
Se antes não havia nenhum programa que abarcasse essa massa que veio para ficar, as administrações que vieram depois também não criaram nenhum mecanismo que adequasse a prestação dos principais serviços públicos à nova demanda que só aumentava cada vez mais. Por isso que além de escola e hospital, não há casa para todo mundo nessa metrópole chamada São Paulo.
E aquele velho jogo de empurra só piora a situação, pois, além dos governos estadual e municipal, a esfera federal também tem sua cota de culpa e responsabilidade.
Na época em que se intensificava o fluxo de migrantes provenientes de regiões afetadas pela seca, as administrações da cidades de origem não tinham condições de assentar seu próprio povo, e o governo federal, ciente da urgência de um grande projeto para fixar o homem do campo em seus domínios, não teve força e vontade política para implementar, por exemplo, a obra de transposição da águas do Rio São Francisco, que até hoje se arrasta por força do choque de interesses políticos nas localidades contempladas pelo empreendimento.
Por conta disso, cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e outras capitais do país tiveram crescimento demográfico desproporcional à oferta de serviços públicos à população.
Dentro do espectro das ocupações irregulares, apenas a questão do déficit habitacional se destaca, mas é claro que a reboque disso a precariedade dos demais serviços vem à luz dessa realidade.
As comunidades carentes de todos os centros urbanos do país ilustram perfeitamente esse cenário, onde a exclusão e o descaso norteiam a vida das pessoas dessas localidades, que só diferem de imóveis habitados irregularmente pela dimensão maior, pela geografia, mas com a mesma distância do poder público, demonstrando que o déficit habitacional nos maiores centros urbanos do Brasil é muito maior do que se parece.
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