sábado, 29 de junho de 2013

Viva o povo brasileiro!

    Longe de mim reproduzir o estilo estupendo das construções gramaticais e sintáticas de João Ubaldo Ribeiro em sua nobre e irretocável arte de retratar as mazelas do brasileiro. Só que para quem se acostumou a sentir de perto a aflição que reside na base da pirâmide, fica fácil descrevê-la, mesmo que em linhas tortas.
    Uma das coisas mais exaltadas pelos estudiosos, escritores, novelistas, corneteiros e congêneres é a capacidade da população brasileira de resistir às intempéries do cotidiano, enquanto os mentirosos insistiam na tese de que as coisas haveriam de melhorar.
   Mesmo com o lombo ardido de tantas bordoadas, lá estava o povo se refrescando na laje, o pagode comendo solto, o churrasco no ponto, a cerveja gelada, o rolé pelo shopping, e o resto, empurrando com a barriga.
    O futebol quando funcionava como válvula de escape imperou por muito tempo como ícone de congraçamento social. A cada troféu levantado, o triunfo coletivo e as esperanças renovadas.
   Hoje, eis que o espetáculo da bola na rede já não remonta o clímax das massas, o gozo frenético que tanto extasiou as multidões, enquanto o homem da lei se blindava com suas jogadas de efeito.
   Pela capacidade que o povo brasileiro começa a ter de separar o joio do trigo, o espetáculo do futebol vai também perdendo esse poder de minimizar o desconforto dos indivíduos; vai aos poucos desconstruindo a velha cortina de fumaça entre o oculto e o explícito; vai lentamente neutralizando os efeitos da anestesia geral.
   Se antes já se exaltava em prosa, crônica e verso as agruras do homem brasileiro, hoje se festeja a mudança de rumo que ele mesmo promoveu para si, através da literatura dos novos tempos, o mundo virtual, um novo instrumento capaz de expor as mesmas feridas, antes fadadas a não cicatrizar jamais.
   Em três semanas ou mais de manifestações pelo Brasil ficou evidente o surgimento de um novo homem racional; o que está dentro e fora das quatro linhas; aquele que se diverte e corre atrás do prejuízo. 
   A liberdade que lhe permite fazer escolhas se mostra mais forte, no momento em que ele parecia inebriado pelo ópio, pelo ufanismo, pelo jogo de cores e palavras. Dentro do estádio, a torcida brasileira não hesita em torcer pelo mais fraco diante do monstro que pode nos ferrar na lá na frente, na final.
   Se o torcedor-eleitor transportar essa tendência para as urnas, aquele sujeito com apenas 1% de intenções de voto pode ser mais instigante pelas suas propostas que o rei da cocada preta. Basta ele ter essa percepção durante o processo eleitoral. A dignidade passa a contar ponto nesse processamento de ideias. 
   É por isso que fizeram reverências ao Taiti e execraram a Espanha, a única que pode desmoronar a nossa soberania futebolística, pelo menos nessa Copa das Confederações.
   Daqui para frente, essa será a tônica de um novo tempo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário