Aquela imagem do homem transportando às pressas um cilindro de
oxigênio para salvar um parente internado dá a dimensão da calamidade que
atinge o Brasil nesses tempos de pandemia. A gente fala de calamidade apenas
para ilustrar a penúria que não deveria existir. É claro que há outros fatores
que completam esse quadro medonho, em que a expectativa de vida das pessoas é
quase nula.
É
triste ver o Brasil com todas as suas instituições e órgãos públicos
aparelhados, mas completamente inertes nas mãos dos homens públicos, que parece
terem perdido a noção do princípio da coletividade, do conjunto que faz tudo
isso funcionar, as cidades, os estados e o país.
Ao
mesmo tempo em o cidadão comum ignora as regras de convivência em sociedade,
quando há a necessidade e a responsabilidade dos cuidados básicos para combater
a doença, o próprio poder público também age de acordo com a conveniência dos
mandatários, cada um na sua esfera de debilidade política.
Esse
caso triste em Manaus é um assunto de ordem nacional, em que deveria reunir
todos para uma única solução: salvar vidas. Era para estar o presidente, o
governador e o prefeito local juntos numa agenda de gerência de crise, como bem
propõem e sugerem as prerrogativa de cada um deles em seus cargos. Isso é o mínimo
que poderia rolar dentro de uma questão humanitária. É o mínimo se
eles estivessem de fato preocupados com a população, apenas tentam transparecer
isso, mas sem, no entanto, agir de acordo. O que se vê é cada um querendo tirar
proveito da situação, como nas outras tragédias pelo país afora, em que vidas
humanas se perderam, nada foi resolvido, mas mesmo assim teve gente lucrando
com a situação de uma forma ou de outra. Veja os casos de Brumadinho, Mariana,
região serrana com as chuvas fortes, estão até hoje esperando por soluções, mas
pode procurar que alguém tirou proveito da tragédia.
Nesse
quadro da pandemia é a mesma coisa. O presidente Jair Bolsonaro fica ai nessa disputa
política com o João Dória, e não sossega enquanto não for dele o pioneirismo da
vacina contra a Covid- 19. Ele como mandatário do país tinha de estar lá no
front, nos escombros, vendo a situação dos estados, colocando toda
infraestrutura da União para auxiliar os governos estaduais. É assim que um
líder político se comporta, não batendo boca com adversários políticos,
atacando a imprensa e o aparelho jurídico a todo instante, num expediente bem
distante de suas reais responsabilidades que seu cargo confere.
Pode ser que agora com a aprovação
das primeiras vacinas pela Anvisa o governo se comporte como o gestor público eficiente,
mas sem comemorar, porque, seguindo as atribuições do governo federal para solucionar
o problema, não faz mais que obrigação a atuação correta e visando à saúde da população.
Em nome do individualismo, seja do homem público
ou do cidadão comum, nunca se viu de forma tão intensa no Brasil a politização
de uma questão social e humana. Vê-se agora o desprezo pela vida das pessoas
numa dimensão maior. Desde o sujeito que ignora sua própria proteção e se
aglomera sem culpa alguma; as prefeituras que flexibilizam a rotina da cidade
por força de interesses comerciais; aos políticos sem escrúpulos que querem se
eternizar no poder, tudo contribui para desconstruir o caráter coletivo dos
grandes problemas nacionais, tudo isso deixa o cidadão de bem entregue à
própria sorte, como o brasileiro lá em Manaus levando o oxigênio para o seu
parente.
Já
houve a crença de que estaríamos evoluindo a cada desafio lançado em nossa
realidade. A experiência de tanta resistência e luta desenharia o melhor
conjunto da sociedade brasileira. A maturidade que a gente parecia alcançar nos
faria um povo à frente do nosso tempo. Mas, infelizmente as pessoas,
independente de seu papel social, instituíram de vez o velho expediente de
puxar a brasa pra sua própria sardinha.
A essa
altura do campeonato, a vacina que vai chegar só vai amenizar a dor do momento,
pois a sociedade vai continuar doente de outros males. Porque, pelo
menos para o individualismo não há nenhum remédio para combatê-lo, por
enquanto.
domingo, 17 de janeiro de 2021
MUITO ALÉM DO OXIGÊNIO
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