terça-feira, 28 de junho de 2022

POR UMA MENTE MAIS LUBRIFICADA



    Certa vez, conversando com uma senhora sobre os problemas de saúde que todos nós vamos adquirindo e acumulando ao longo dos tempos, ela disse com muita segurança e propriedade que estava feliz por envelhecer de baixo para cima.
     Era a sabedoria de quem já estava calejada o suficiente para administrar seus dramas e doenças que vão surgindo, e o privilégio de viver o que parece ser a via mais saudável enquanto vamos sofrendo a degeneração natural.
    Ninguém está ileso de algo que vai nos incomodar bastante numa fase qualquer de nossa existência, mesmo com todo o tratamento adequado, porque há sempre uma dor aqui e ali, mas é realmente melhor que a cabeça seja a última parte do nosso corpo a parar de funcionar.
     Fiquei por muito tempo pensando na fala maravilhosa daquela senhora e na capacidade que cada um de nós pode ter de suportar uma dor qualquer, seja ela física ou psíquica, no momento em que o cérebro, a mente, enfim, essa máquina que comanda nossas ações continue funcionando a pleno vapor.
    Não que as outras doenças não precisem de atenção, investimentos e estudos, mas as ocorrências relativas ao cérebro é o maior desafio da comunidade científica do mundo inteiro até hoje, sempre será. O primeiro sinal de evolução humana se deu justamente com as transformações que o cérebro de nossos ancestrais sofreu. E isso, claro, influenciou todas as mudanças no mundo.
   De lá pra cá a mente humana produziu coisas maravilhosas, mas aproveitou também muito mal sua inteligência, em detrimento de sua própria espécie.
    Se a gente acreditar que as boas ações vão sempre prevalecer sobre as vacilações do ser humano, vai valer a pena mais e mais esforços para todos aqueles que se debruçam sobre a mente humana, não só investigando o que nossa cabeça é capaz de produzir, como também criar novos procedimentos, medicamentos que possam efetivamente evitar a degeneração precoce da mente humana.
     O mundo carece de novas ações. Há uma expectativa cada vez maior por outras formas de vida, comportamentos, olhares sobre o mundo, e isso requer mentes mais saudáveis, que comandem novas práticas. Não essas aberrações de hoje. Quanto mais nós e as próximas gerações tivermos a oportunidade de ampliar nossos horizontes nos planos individual e coletivo, é uma contribuição que cada um estará dando para a construção de uma nova era.
    Independente das intenções do homem em geral, é melhor que as engrenagens do cérebro humano fiquem mais tempo em funcionamento.

quarta-feira, 22 de junho de 2022

QUE REFORMEM OS CÓDIGOS

  

   A sociedade vai acumulando esses episódios de violência cotidiana sem garantia alguma de reparação e, claro, de punição à altura do destempero cometido, como forma de lá na frente, sim, o ódio e seus requintes de crueldade não sejam mais frequentes e banais.
    Isso seria o primeiro cenário vivido se tivesse havido no passado um movimento para combater o que já se anunciava como algo que iria comprometer a nossa formação e todos os pilares da convivência humana.
     Já nem adianta mais essa gente chegada à pesquisa, estudos, estatísticas ficar especulando sobre as origens dessa violência contra as mulheres, que vem passando de uma geração para outra sem que a legislação tenha acompanhado e reformado as letras e incisos que deliberam sobre a forma como a sociedade se comporta.
     Apesar de parecer um absurdo, todos esses procedimentos, os trâmites, as defesas, as instruções, as interpretações e, principalmente, as decisões, tudo isso está dentro da lei, ninguém pode contestar, enquanto o que parece hoje um aberração estiver em vigor.
    Agora mesmo, a procuradora Gabriela Samadello foi espancada pelo também procurador Demétrius Oliveira Macedo em pleno ambiente de trabalho, com imagens divulgadas em rede nacional, e ainda assim o agressor foi solto depois do depoimento, segundo o delegado, por não haver situação de flagrante, veja só.
    Para sorte da sociedade, o agressor é servidor público e foi afastado de suas funções com seus vencimentos suspensos, conforme a legislação do funcionalismo da cidade de Registro. Muito bem. Talvez até as manifestações em frente à prefeitura e delegacia tenham suscitado o manifesto da OAB seção local de investir em outras sanções contra Demétrius.
     Não deixa de ser um alento essas punições preliminares, mas, e os outros casos em que não houve pressão, manifestação, enfim. E os outros eventos em que não se permitiu esse cancelamento imediato, ou que a vítima não tenha esse respaldo todo, essa visibilidade? E as pessoas comuns, que nunca têm sua voz e dores ouvidas?
    Os canais de denúncia e os órgãos especializados no combate ao crime apenas tornam públicos os casos, atualizando os números e dados da violência, mas quando os processos entram nos círculos jurídicos, todo mundo que passa pelo crivo da lei, seja ele anônimo, renomado ou influente, tem uma lei arcaica a seu dispor.
    Com relação ao promotor espancador, ele também vai desfrutar dos “benefícios” que a atual legislação oferece, da qual vários outros destemperados já se beneficiaram, e tantos outros mais que ainda se valerão desse atraso jurídico que permite a impunidade e a banalização da violência. É bem capaz de em pouco o agressor da procuradora recupere seus direitos e liberdade, vai vendo 
    Por isso, é necessário e urgente um grande chamamento para atualizar os códigos à realidade atual. A própria Ordem dos Advogados do Brasil que já ensaia um cancelamento à vida do Demétrius, pode perfeitamente encabeçar um movimento de reforma do Código Penal. 
    O caminho é longo, mas o primeiro passo precisa ser dado.

NA MINHA MÃO É MAIS BARATO

 


   Se tem um setor que mais se adaptou aos novos tempos é o comércio. É claro que geral incorporou as novas tecnologias para otimizar a infraestrutura, o retorno, enfim, todos os segmentos, por uma questão de sobrevivência em meio a uma concorrência cada vez mais acirrada.
    Mas o setor de varejo, mais precisamente os supermercados, é que além das inovações como parte de suas estratégias teve mais lucro por conta de novas tendências também.
    Pois bem, os atacadões já vinham há algum tempo como soluções de negócios para revendedores de pequeno porte e tal. O camarada que tem aquela vendinha para atender sua comunidade podia comprar em quantidade maior, abaixo do preço normal nas redes. Acesso restrito à empreendedores.
    Só que de uns tempos pra cá os manda-chuvas do setor resolveram estender a novidade ao consumidor final, mas sem as vantagens que ofereciam antes em sistema de atacado. Acabou virando um mercado normal. Se antes todas essas redes mantinham um grande depósito fora do centro urbano para abastecer as filiais, eles descobriram que poderiam concentrar o próprio depósito e os pontos de venda num só lugar.
    Ou seja, os clientes vão ao próprio depósito buscar a mercadoria. E aquela frota de caminhões para fazer a distribuição saíram de circulação. Uma economia de combustível, pessoal e toda a despesa de logística que agora é bem menor, uma mudança que aumentou consideravelmente a margem de lucro dessa gente bronzeada e olho grande.
     Agora, pergunta se eles deram aquela moral para o consumidor, se esse novo cenário trouxe vantagens para alguém, no caso, o freguês. Os caras cobram até por aquelas sacolas gigantes. Você pode aproveitar as caixas de papelão que os repositores deixam lá à sua disposição para levar as compras. Mas já há registros de gente vendendo essas caixas por 99 centavos, fiquei sabendo.
    Vai chegar uma hora que eles vão dispensar os repositores e deixar uma escada pra você pegar lá em cima se acabar embaixo. Vai ter um QR code pra o cliente mostrar que está interagindo com o sistema, e de repente um desconto pelo aplicativo.
     É a mais-valia ganhando uma nova roupagem, enquanto vai minguando o velho conceito de alguma coisa a preço de banana sempre perto de você.

terça-feira, 21 de junho de 2022

A HORA GLACIAL

  

   Definitivamente, o inverno não é coisa que se deva comemorar, apenas curtir, porque dura pouco, igual a alegria de pobre, dizem por aí. Aos que não acham graça alguma nessa friaca, só resta aceitar que dói menos.
    E os caras do clima já avisam antecipadamente que o inverno vem chegando, tal dia, até a hora exata. Aí o sujeito já vai dormir sabendo que quando acordar a era glacial já está lá fora numa nova temporada.
    E como não bastasse o desconforto físico para quem já está acostumado a andar de bobeira com a camisa pendurada no ombro, há um descontrole total nas ações do dia a dia, porque o sujeito acaba perdendo a concentração para cumprir aquela agenda normal de sempre, tudo na sua ordem cronológica ou de prioridades, enfim, uma prova de que o cérebro que organiza tudo isso também sente essa mudança, e trabalha assim de forma analógica.
    O resultado e os efeitos da friagem na vida das pessoas é o desmantelo total para cumprir uma simples rotina, vai vendo. Nos próximos meses, será normal, tranquilo, a vida de quem tem horror ao frio virar de ponta à cabeça.
     O cara já começa o dia tendo que tomar um banho super gelado pra não ficar refém do casaco no decorrer do período. E o velho ritual de tomar banho acaba se tornando o primeiro tormento. Não é masoquismo algum, ninguém quer sofrer, claro, mas é necessário aquela ducha congelante pra quebrar o gelo lá da rua, tudo rapidinho, lógico, vapt vupt.
    Aí, quando o cara vai se ensaboar percebe que o sabonete tá no fim, é aquele finalzinho que fica praticamente grudado ali na saboneteira. Vai ter de ser aquele mesmo. Imagina, sair todo molhado para buscar um sabonete novo lá na dispensa. O tempo é curto e além do mais, aquele pequeninho mesmo serve, é só pra tirar aquele cheiro de cama que neguim ostenta de manhã no metrô, no busão.
    Mas eis que dá pra piorar o que parecia sob controle naquele momento. Aquele minúsculo sabonete que resolve seu problema imediato, aquela coisinha cai no chão com a velocidade de lavar tudo ao mesmo tempo, entende? Pois é, aí você apanha o bagulho do chão. Quer dizer, você tenta, né, porque ele gruda no chão, e quanto mais você vai forçando para sair, ele toma até outra forma, tipo aquela massinha das crianças.
     A essa altura, a água nas costas fustigando as costelas e a alma ao mesmo tempo, e o cara tentando arrastar o sabonete para aquelas divisas entre um piso e outro, fazer uma alavanca, tirar o troço e dar fim a todo o martírio. Um sofrimento que na verdade, nem deveria tá rolando, pois, dava pra usar o shampoo, né, ô, cabeção!
     Tudo bem, não há garantias de que o frio interfere nas funções cerebrais, mas desconfio. 
      Para quem gosta de frio, bem vindo ao inverno, aproveite, receba.

terça-feira, 14 de junho de 2022

ANARRIÊ ERA UM CHAMADO



   Aos poucos vai sumindo, vai se ouvindo cada vez mais ao longe os últimos acordes daquilo que era prenúncio de uma grande festa, lembra? Era a chamada para que todos chegassem para a festança. Dá uma angústia danada só de saber que não haverá mais aquela maravilha de alvoroço por um mês ou mais em vários recantos da cidade. Mas é uma angústia em formato de saudade.
    Pois é, nessa época do ano havia em todos os cantos um barulho de sanfona ecoando bem de longe. Você, sem querer, até se pegava, já se balançando todo naquele mesmo compasso de sempre, que vai ou não vai. A cidade parava; a semana ficava diferente enquanto o final de semana não chegava.
     E é também pra bem longe do tempo que a gente se transporta, hoje, naquela viagem cheia de bandeirinhas coloridas pelo caminho e o céu pintadinho de balão.
    Das saudades que a gente sente, talvez essa também tenha várias histórias ao redor, porque era o mesmo tempo em que quase tudo se formava. Do núcleo de família ao ambiente escolar, havia valores atrelados a quaisquer sonhos e aspirações. Era tudo conectado. Ninguém se desgarrava de sua realidade pra viver aquela vibe. Simplesmente, se conciliava tudo numa mesma agenda, num mesmo calendário.
    Na efervescência dos primeiros amores, tinha de chegar em casa antes de a fogueira se apagar, mas dava tempo das delícias das paixões juninas e proibidas também, e seus outros encantos, que logo logo as férias terminavam.
    Quem não se lembra daquela música chiclete que não saía da cabeça porque era a trilha sonora da festa e do flerte que todo mundo teve a chance de materializar, quem nunca? O beijo que eu tentei a sorte na escola, eu esbarrei com ela no arraiá. Foi difícil esquecer aquela paixão. Quase bagunçou meu desempenho escolar, oh meu Deus!
    Mas a azaração era só um ingrediente a mais na grande confraternização que conectava toda a cidade. Havia lugares que eram pontos de concentração, de encontros das quadrilhas, um monte de ônibus chegando, recepção calorosa, fazia parte do protocolo o entendimento entre as tribos.
    Hoje, fica difícil reproduzir aquela maravilha em sua plenitude, no momento em que algumas vertentes da cultura popular vão se esvaindo como a fumaça das fogueiras. Aos olhos da nova geração, parece que nada mudou, mas é mentiraaa.
    A minha geração por um momento pensou que tombariam esse patrimônio que nós soubemos conservar. Agora, a gente tem de contar as histórias, porque nossos filhos e netos não as viverão.
     Fica a lembrança de como era doce aquela ciranda. Anarriê! Que saudade daquela paz na roça!

quinta-feira, 9 de junho de 2022

COMO NOSSOS PAIS



   Eu tenho visto nas ruas da cidade um número cada vez maior de pessoas usando máscaras, mesmo com a flexibilização em vigor, depois que a Covid-19 deu uma trégua. Mas parece que a doença apresentou novos números que fizeram muita gente recuar do uso facultativo do acessório.
     Tem gente que já usa direto, assim que sai de casa, e outros que só botam a máscara em ambientes fechados, transportes, comércio, enfim.
    Em meio à probabilidade de aumento nos casos da covid, há um horizonte positivo nessa nova movimentação: a responsabilidade das pessoas com o coletivo, a contribuição que cada cidadão dá para uma causa importante que deixou marcas, todos sabem.
    Eu lembrei de como nossos valores surtem efeito em nosso ambiente, nos caminhos que todos vão trilhar. Parei para ver aquele monte de gente de um lado para o outro usando sua máscara com muita segurança, propriedade e dignidade. Há ali no livre arbítrio de cada um a obediência a tudo que foi repassado como um grande ensinamento.
    Depois que a gente cresce é que vemos a importância de quantas vezes nossos pais nos mandavam escovar os dentes, tomar banho, enfatizando que não iriam ficar mandando o tempo todo, para sempre. Eles sempre tiveram essa preocupação de sermos íntegros. Por isso que eles falavam toda hora. Eu acho que mamãe ainda me ligaria até hoje para ver estou de máscara, mesmo eu assim, já burro velho.
     Em todas as pessoas como nós que absorveram aquelas recomendações básicas, criou-se o discernimento e a sabedoria de estender para todos os aspectos de nossas vidas a responsabilidade social que foi surgindo dentro do processo de formação como cidadão.
     Ainda há muita incerteza quanto ao desfecho dessa pandemia. Até porque é uma questão global. Mas é nítido o esforço que uma grande parcela faz para que tudo tenha o melhor resultado. A gente caminha por aí e vê sinais de precariedade em todos os cantos da cidade, mas notamos também vestígios de evolução humana com aquele sujeito cuidadoso e extremamente preocupado em não piorar esse cenário.
   Por trás de cada máscara há uma responsabilidade maior com tudo que for inerente à natureza humana. Há alguém que guarda no bolso o papel da bala, pra não jogar no chão o lixo que ele produz no dia a dia. Há alguém que respeita a fila e usa fone de ouvido no transporte. Há alguém que cede o acento do metrô ao idoso. Há alguém que dá bom dia quando chega e com licença quando sai.
     Atrás de cada máscara tem alguém que segue à risca tudo aquilo que nossos pais repetiam à exaustão.

segunda-feira, 6 de junho de 2022

UMA NOVA MENTE NO CONGRESSO



    A gente pode prosseguir com o assunto sobre a renovação do Congresso com muita segurança porque esse processo faz uma abrangência maior para a realidade atual do Brasil.
    É claro que a eleição para presidente da república é importante. Sempre será. Tudo que tem de ser alterado de forma imediata como medida urgente e que tenha um efeito em curto prazo o Executivo tem essa prerrogativa em benefício do interesse coletivo.
     Mas quando a gente lembra que é necessário profundas mudanças para adequar importantes projetos e a própria legislação vigente ao cenário atual do país, o Parlamento é que tem essa missão, através de seus pares, de apresentar os projetos, as propostas que reivindiquem as mudanças.
    Independente da vontade política do governo, seja ele de direita ou esquerda, é o Congresso que vai concluir os trabalhos, caso o presidente tome a iniciativa e acene com projetos que proponham eventuais mudanças.
    Se por acaso o chefe do executivo ficar preso a conceitos de aliados e seus interesses nessas relações cabulosas que a gente tem visto há várias gestões, então a população vai esperar que a Câmara do Deputados, sim, é que ensaie essas mudanças.
    Por isso que eu considero fundamental uma fala diferenciada por parte do eleitorado e dos eventuais candidatos aos cargos de deputado federal e senador em todo o país, uma campanha bem forte, maciça, para que haja uma renovação completa no ambiente do Congresso Nacional, entendendo que esse processo pode durar um tempo longo, duas, três ou mais legislaturas, mas que seja iniciado imediatamente, para que tenha uma dimensão nacional de fato.
    Imagine as coisas que têm acontecido no Brasil ultimamente e até agora não foi discutido com a seriedade que as causas sugerem. A corrupção, a questão do foro privilegiado, as tais prisões em segunda instância, enfim, tudo indefinido ainda, porque mexe em interesses de nobres colegas.
     Com relação à criminalidade, são casos de feminicídio, estupro, menores, homofobia, racismo, questões que precisam de atenção maior do Congresso para adequar as penalizações e eventuais reparações, visando diminuir ou erradicar esses delitos do seio da população.
   Nós sabemos que há uma lista maior de itens a serem revistos na vida dos brasileiros, mas estes mencionados são os que mais têm angustiado a sociedade nesses últimos tempos, e só uma nova geração de parlamentares pode operar as mudanças necessárias.
    É compreensível que toda essa discussão tenha o viés ideológico de sempre, claro, mas se o debate ocorrer fora do extremismo que cerca vários embates na câmara, a própria mudança de mentalidade de novos parlamentares pode facilitar a confecção de códigos mais atraentes e saudáveis para a sociedade brasileira.

domingo, 5 de junho de 2022

A PARTILHA



   Há sempre uma dúvida sobre como começar a escrever os assuntos de mais uma eleição no Brasil. O tempo vai passando e aumentam também os problemas a serem resolvidos, claro, e por mais que se adote prioridades, o critério nem sempre é o ideal.
     Os brasileiros já estão carecas de saber dos principais assuntos a serem tratados. Vão acontecendo coisas no Brasil, e quando se pensa quais serão as pautas para mais uma disputa, eis que tudo vai tomando o mesmo rumo de sempre, ou seja, ninguém dá importância a nada.
    Mas a gente que é a parte mais sofrida de todo esse processo vai entendendo os motivos pelos os quais os maiores problemas dos brasileiros vão ganhando sobrevida.
     Já está na hora de a sociedade começar a repensar a forma como ela própria contribui para toda esse estado de coisa. Já não basta discutir a precariedade dos serviços públicos, a corrupção, as reformas e outros mais.
    Além do descaso, a população ainda paga do próprio bolso para que toda essa bagunça continue. Cada cidadão desse país dá sua cota de contribuição para que nossas próprias mazelas se perpetuem. Ou seja, a gente está patrocinando nosso próprio martírio. E o pior de tudo é que isso passa despercebido de muita gente.
     Mesmo que o Brasil estivesse num processo considerável de evolução em todos os aspectos da nossa realidade, esse montante destinado ao processo eleitoral já seria um absurdo. Mas como há precariedade, mazelas e toda sorte de aberrações na agenda brasileira, esse fundo eleitoral é uma afronta à dignidade das pessoas de bem nesse país.
     Não tem como dar início a um amplo projeto de reconstrução do Brasil com essa mancha, essa coisa bizarra, esse gasto supérfluo frente às maiores necessidades e urgências para a população brasileira.
 Com certeza não será nessa eleição especificamente que isso será discutido, mas é preciso pressa. É um processo longo que vai exigir a participação de todos.
    Considerando que são os próprios parlamentares que podem deliberar sobre o assunto, será preciso uma nova geração de políticos totalmente comprometidos com a transparência, a responsabilidade com o dinheiro público.
    Para isso, é necessário uma ampla campanha de renovação do Congresso em todos os estados brasileiros. Não adianta só mudar o presidente da república. Tem de tirar de cena toda essa corja, da direita, da esquerda, do centro, que legisla faz tempo e ainda põe seus herdeiros para dar continuidade ao velho processo. É essa gente que vai postergando essas aberrações com a coisa pública. Depois daquela pouca vergonha dos financiamentos de campanha com empresários, eles miram agora justamente no que teria de ser usado para benefício da população.
    Nesses novos tempos de redes sociais, em que há uma nova dimensão para o processo eleitoral, essa farra com o dinheiro público pode ser perfeitamente revista com uma nova mentalidade política por parte do eleitorado. Só nós podemos mudar isso.
    Seria o primeiro indício de renovação política que a sociedade brasileira tanto espera e o Brasil precisa.

                                                  Arte: O GLOBO

sexta-feira, 3 de junho de 2022

A VOLÚPIA DOS LÁBIOS


      A ideia é que com o tempo aqueles dois corpos se fundam num só. Isso era bem provável, pois a cumplicidade entre ambos está no mesmo nível do amor, do sexo, essas coisas. Até passa despercebido de muitos casais o detalhe das chamas de corpos nus depois de várias vezes em ebulição. É sabido e há registro de tantos outros casais que já não se importam com a química que ainda pode reacender a velha chama.
     Mas para aquele casal, não, nunca teve essa interrupção. Eles nunca deram moral para suas libidos perderem o fôlego e não mais alavancarem suas vidas social e de alcova, porque já havia há muito tempo um processo de devassidão mútua, tudo consentido por seus anjos e fantasmas.
    Só que ultimamente tem batido um certo cansaço. A vida está corrida para os dois. Cada um para um lado, correndo atrás do pão, quase não sobra tempo pra comer a carne. Nossa, que horror! Mas é a pura verdade. É uma agenda bem escassa esse expediente de fazer sexo. Não é mais a toda hora que os lençóis voam. Nem os travesseiros saem mais do lugar de tão monótono que está o negócio.
    Não é possível, deve ter um momento qualquer em toda essa agitação do dia a dia que traz a lembrança do silêncio que falava as coisas no ouvido, das bocas que murmuravam, e ficava tudo em desalinho ao redor. Bate uma saudade danada, a nostalgia da libertinagem só dos dois, fechamento como os amantes falam hoje.
    Hoje, a única coisa que está salvando é aquele sexozinho sem vergonha debaixo dos lençóis, sem preliminares, sem sedução, cada um arregaçando suas vestes. Será por isso que os pijamas são largos? Por sorte que ainda faz umas fagulhas por ali, rapidinho, nada está perdido. Mal ou bem ainda rola o gozo que sacode os dois simultaneamente, e um beijo ardente de durma bem, porque foi bom esse bagulho, ô, se foi... É só uma questão de tempo e conversa retomar a velha ordem.
    Se tem algo ou alguém que tenha interferido no processo, certamente conspirou a favor, algum deus, anjo ou orixá, sei lá. Surtiu o efeito desejado a satisfação recíproca, enquanto dormiam de conchinha naquela noite, ainda mais agora que veio a certeza do quanto ainda se atraem, se desejam e se amam.
     É resenha que fala, né, essa prosa informal, quando os interlocutores se conectam entre ideias e propostas. Quanto tempo não se falavam abertamente, francamente, sobre seus propósitos de vida, da carne ao espírito, com a mesma cumplicidade dos tempos de bonança. A quanto tempo não se olhavam com excitação, inclusive?
     Eles lembraram que era comum se beijarem durante o sexo, porque é parte integrante de seus momentos morderem os lábios do outro ao longo do coito. Aquilo era a válvula de escape deles. Podia ser menos importante, fútil para outros seres, mas para eles era imprescindível. Parece que a seiva que se desprende daqueles corpos tem mais intensidade quando se mordem ardentemente. É coisa deles esse arrebatamento em larga escala.
      Depois dessa, é bem capaz de nunca mais separarem seus destinos de seus desejos. Foi bom pra eles essa conversa sobre a volúpia dos lábios.