sexta-feira, 25 de setembro de 2020

A BRASA NA SARDINHA

       Aos poucos vai tudo voltando ao normal na cidade. Aquela efervescência da qual rolava uma saudade danada vai retomando o seu formato original. Novamente a velha confusão de carros e pessoas em todos os quadrantes da cidade maravilhosa. 
   Eu cheguei a transitar pelas ruas completamente vazias no auge da pandemia e ficava imaginando que numa época distante o Rio de janeiro já foi assim, sem essa atmosfera, sem essa vibe de hoje. Se um dia o Rio ficasse assim novamente, teria que muita gente meter o pé daqui e voltar só nos feriados ou em outras ocasiões pra visitar quem ficou por aqui tomando conta das coisas, das praias, das praças, dos morros e das matas.
   A gente fica até especulando se a cidade do Rio não fosse uma metrópole global ela poderia estar funcionando melhor, sei lá, porque, tem tanta cidadezinha por ai funcionando a todo vapor sem tirar o charme e o bem estar de sua gente.
   Mas a verdade é que a gente já se acostumou com essa bagunça que tem aqui, esse calor das pessoas, a fumaça dos carros e todo mundo fazendo barulho ao mesmo tempo.
   Pois bem, seria maravilhoso ver tudo em seu lugar novamente depois de um período turbulento de recolhimento e o velho Rio de Janeiro voltando a respirar. Seria interessante saber que fizemos a nossa parte com rigor e disciplina, por isso que a gente merece essa volta triunfal. A gente ficaria mais aliviado se tivéssemos de fato livre de qualquer perigo que ainda ronda o mundo, mas, infelizmente não dá pra ter aquela sensação de dever cumprido que deixaria todos com mais ânimo para voltar às atividades.
   Vendo toda essa movimentação a primeira impressão é que cada um vai tentando sutilmente suprir sua própria necessidade, como diziam antigamente, cada um se safando e se resolvendo de acordo com suas conveniências. 
   Como já há um recuo em outras praças onde os casos de Covid ainda persistem ou voltaram, lugares onde houve, inclusive, um confinamento mais rigoroso, fica difícil imaginar que estaremos seguros com certeza, mesmo com pouco tempo de isolamento que a cidade do Rio viveu. 
   A preocupação aumenta ainda mais quando a pressão pela volta das atividades se dá por interesse do mercado, sem qualquer informação das autoridades científicas dando garantias para essa retomada. 
   A gente nota uma pressa enorme dos dirigentes de escolas, museus, cinemas e estádios de futebol sem saber se eles têm um planejamento para a reabertura de suas casas, se existe uma preocupação social maior que os lucros que almejam. Afinal de contas, são esses ambientes os que justamente acumulam pessoas pra consumir os serviços e produtos oferecidos, mas que graça vai ter um bar lotado, um shopping bombando, uma arquibancada em festa, com a iminência de outro contágio? E o esforço daqueles que seguiram à risca todos os protocolos?
    A gente até dispara essas críticas sobre todos os envolvidos nas atividades, os clientes, os funcionários e o chefe, mas o poder público, como gestor da cidade e das crises é o único que não pode se deixar levar pelas pressões que sempre rolam em bastidores. Estão na esfera de governo os órgãos e especialistas que lidam com a questão da Covid com racionalidade, os que têm o retrato real da doença, dados que definem como deve ser agenda da cidade nesse cenário. A voz maior numa hora dessa é da comunidade científica, e a sociedade precisa ter essa noção, em vez de agir com interesses, puxando cada um brasa pra sua sardinha.
   Que a cidade do Rio de Janeiro possa retomar sua rotina com segurança. Pra isso, é preciso mais engajamento das pessoas. Só assim teremos de volta aquela cidade frenética, o couro comendo, o bagulho doido, enfim, essas loucuras que fazem o Rio andar de um lado para o outro sem parar.
   

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