Não é difícil perceber que há um
interesse muito maior sobre os valores que os médicos tipo-exportação vão
receber para clinicar em terras brasileiras do que a realidade que eles
certamente viverão nos mais longínquos centros de penúria e degradação humana
que ilustra o cenário da saúde pública no Brasil.
Eu não acredito que alguns
desses doutores vão precisar mexer em seus parcos vencimentos para levar gazes,
esparadrapos e soro caseiro para abastecer ambulatórios porque o poder local,
com a ajuda do governo federal, claro, não vai deixar que esse tipo de coisa
aconteça, imagine.
Depois que o Conselho Federal
de Medicina descartou a possibilidade de os médicos nativos receberem
esses valores a título de bolsa-estudo, sem vínculo empregatício, tempo de
serviço, essas coisas, tudo parecia caminhar para futuros esclarecimentos e
ponderações fora da órbita da infraestrutura da saúde pública.
Na chegada ao Brasil,
preocupa mais as condições excepcionais dos forasteiros, acomodados em
instalações militares, sem dar entrevistas, num aparato digno de trabalho
escravo, como chegaram a ventilar, do que a misericórdia de quem espera na fila
por um transplante, uma consultazinha para um brasileirinho com a barriga cheia
de lombrigas ou os que recorrem ao chá de quebra-pedra para amenizar a angústia
que grassa do Oiapoque ao Chuí..
Com toda a batalha jurídica
pela revalidação dos médicos estrangeiros e a garantia da categoria de que não
haverá negligência aos pacientes, o corporativismo da classe continua vivo como
sempre, principalmente na sua face mercantilista, de mero oportunismo nos
rincões, aonde o atendimento às demandas urgentes não chega a remexer nos
indicativos sociais, mesmo que um universo de assalariados disponha de um
mísero Plano de saúde, que na maioria das vezes dá problema, justamente na hora
em que mais se precisa de uma consulta, um exame, parto ou outro procedimento
de urgência.
Nas regiões metropolitanas
dos grandes centros urbanos há sempre uma clinicazinha de médicos associados
com preços módicos para situações sem grandes complexidades, permitindo um
xaropezinho de amostra grátis, um preventivo a 40 merréis ou um tratamento dentário para pagar
igual à carnê de geladeira.
Na verdade, a população que
depende da excelência desse serviço luta em duas frentes: o poder público e a
elitização da classe médica.
Então, vamos combinar uma
coisa. Esse negócio de trazer médicos lá da Cochinchina não passa de propaganda
eleitoral do governo federal com assistencialismo tipo-exportação.
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